09/12/2020
Projeto Integrar
Insônia, angustia, estresse e desmotivação têm sido sentimentos muito recorrentes entre professoras e professores nesses nove meses de ensino remoto, vividos durante a pandemia do novo coronavírus.
A pressão para se adaptar à tecnologia em um curtíssimo espaço de tempo, a dificuldade de se construir uma rotina saudável entre docência e os trabalhos domésticos, a desmotivação e falta de acesso das/os estudantes aos ambientes digitais, o medo e a incerteza sobre a eficácia do trabalho para aprendizagem desses mesmos estudantes, além da preocupação sobre o estado emocional e físico delas e deles, as mudanças que a nova realidade fizeram nos nossos corpos, a falta ou até ausência de contato próximo com os estudantes. Tudo isso nos aflige e, agora, faz parte também da nossa rotina de trabalho.
Nos últimos meses, abrimos espaços pra conversas e trocas entre educadoras e educadores e também especialistas da saúde mental em Paracatu. Desses encontros, aprendemos bastante sobre nós mesmas/os e sobre a importância de se pensar a saúde de forma integral (corpo e mente).
O primeiro Encontro para Educadoras(es), o psicólogo/psicanalista Vinícius Carossi, nos convidou a pensar um pouco sobre o que está no âmbito da impotência e o que está no âmbito do impossível. “É impossível oferecer uma aula do mesmo formato, e da mesma efetividade que a gente oferecia antes e também acho impossível que os alunos tenham o mesmo desempenho igual ao que eles tinham antes”. Segundo Vinícius, cada profissional precisa construir seu próprio limite. “A gente não conseguiu convencionar o que é possível se ensinar, porque a gente não tem parâmetro para comparar”, apontando para o fato de que essa experiência é completamente nova para todos.
Entre as possibilidades e os caminhos para lidar com os incontáveis desafios, construímos de forma conjunta sugestões de soluções a partir de experiências que deram certo, tais como grupos de apoio sobre o usa de ferramentas eletrônicas, atividades físicas para ajudar o corpo e a mente a lidar com esse novo formato de trabalho, brincadeiras e atividades utilizando a câmera do computador como dispositivo (no caso das aulas síncronas) para motivar os alunos a ligarem as câmeras, etc. Esse momento coletivo para busca de soluções nos fez perceber a importância da união de professoras/es e de se construir espaços de troca de boas práticas, que sempre foi essencial, se torna ainda mais importante agora nesse momento em que estamos isolados. O distanciamento físico não pode impedir que estejamos juntos e unidos para trocar ideias e ultrapassar esses obstáculos.
Nunca foi tão importante que atuemos em rede para que possamos pensar a educação de todos os estudantes do município e não de um grupo específico e para que possamos nos ver como um todo. É importante sempre lembrar que não estamos sozinhos e perceber que existem sim coisas boas para se tirar desse momento tão obscuro, entre elas, esse fortalecimento da união dos professores que, desamparados, tiveram que buscar uns aos outros para se fortalecer.
Mas não se pode pensar que tudo é perfeito. Estamos cansados de tantas horas na frente da tela. Mas é preciso explorar a tela para outras utilizações, para além do trabalho. “Procurar outros espaços online para você”, como disse Vinícius. E porque não reviver a sala dos professores, mesmo que seja utilizando a tela do celular? Fazer uma vídeo–chamada com um colega de trabalho para falar de qualquer outra coisa, que não seja trabalho, compartilhar um bom café da tarde, deixar que eles entre na sua casa assim como você entre na deles. Não parece um bom motivo para uma pausa no meio do trabalho para poder voltar com mais ânimo?
Durante a conversa, o que apareceu como possibilidade de tratamento é o encontro, a conversa, o afeto. Nem que seja virtual. “É relembrar que uma sala de aula, uma escola, ela é um órgão vivo. Ela não é um protocolo. Não é um conteúdo a ser passado. Existe uma vida ali que acontece na sala dos professores, nos corredores e em muitos outros lugares”.
Já no segundo Encontro para Educadoras(es), nossa conversa girou em torno da necessidade que estejamos bem para podermos cuidar dos nossos estudantes. Estamos preocupadas com eles, e como educadoras, sempre colocamos eles em primeiro lugar. Mas não é possível cuidar de alguém se nós também estamos doentes. É o que lembra a professora e psicóloga, Analice dos Santos: “Têm horas que a gente tem que ser um pouquinho egoísta mesmo, e pensar um pouquinho na gente, pensar nas coisas que fazem bem para a gente, pensar na importância de se construir uma rede de apoio”.
Para isso, e considerando o contexto complicado que passamos, é preciso pensar em estratégias de respiro para dentro da nova rotina que, forçadamente, nos vimos agora. Criar uma nova rotina, e que nela, inclua atividades que nos fazem bem. E se comprometer com esses momentos para você. Algumas das ideias que apareceram foi cultivar plantas, criar um pet, dançar (mesmo que seja sozinho), meditar, ouvir música, cozinhar algo que você goste.
É importante também pesquisar e conhecer sobre os sentimentos e patologias que vêm ganhando fama durante a fase de distanciamento social, tais como depressão e ansiedade e, se necessário, buscar ajuda. Analice aponta para a importância de esclarecer sobre o papel do psicólogo e do psiquiatra: “O psiquiatra vai entrar com medicação e vai trabalhar as questões orgânicas e fisiológicas. O psicólogo vai trabalhar com o seu emocional. Nosso instrumento de trabalho é a fala”. Ela aponta ainda que psicólogo e psiquiatra não são inimigos, mas sim, parceiros.
Entendo esses aspectos, não só a psicóloga, como também várias educadoras presentes no encontro relataram sobre a importância de ultrapassar preconceitos e não ter medo de buscar por ajuda, seja ela qual for. “Não tenha medo de procurar ajuda. Se a gente cuida do nosso corpo, a gente tem que cuidar da cabeça, porque não tem como cuidar de um sem cuidar do outro.”
Quando comentamos sobre o momento correto para procurar ajuda, Analice comenta que, para ela, não existe um momento certo e que é importante a gente se conhecer: “Olhar para a gente, pensar no que a gente está sentindo, falar: será que isso está certo? Será que isso é o normal? E questionar de verdade o ‘normal’.” Analice comenta ainda: “Eu recomendo que isso seja feito com profissionais? Recomento! Mas isso pode ser feito entre vocês também. Falar o que você está sentindo, o que você está pensando.”
A pandemia e o isolamento nos deram mais oportunidades de olhar para nós mesmos. E para esse e qualquer outro momento de crise, o autoconhecimento é uma arma poderosíssima. “A importância de nos conhecermos é para que a gente saiba o que é bom para a gente. E a gente não pode delegar essa função para outra pessoa. O psicólogo não vai te dizer o que é bom para você. Mas ele vai te cutucar, estimulando que você pense o que é bom para você. Para você pensar como você pode pensar o que é bom para você.
A campanha Saúde Mental: Eu Cuido! se insere no contexto do Programa Integrar Contra a Covid-19: Força-tarefa, e surge em resposta às demandas detectadas durante o diagnóstico rápido, realizado na cidade de Paracatu para a implantação do programa. A campanha engloba o levantamento de projetos e profissionais de saúde mental no território; divulgação de trabalhos e projetos na plataforma do Programa; criação do quadro semanal “Se Cuida!” no programa de rádio Integrar Educação contra a Covid-19, entre outros. Todos esses dados podem ser acessados na plataforma da campanha no acima.
O Instituto Península, uma organização social que atua nas áreas de Educação e Esporte para aprimorar a formação de professores, desenvolveu o Vivescer. Trata-se de uma plataforma que abriga uma comunidade com espaço para reflexões, troca de experiências e ideias sobre a profissão de educador(a). Através dela, você pode participar ainda de percursos de aprendizagem que lhe ajudam a estar em constante desenvolvimento. São quatro jornadas de aprendizagem: corpo, emoções, mente e propósito. Cada jornada é composta por quatro percursos de aprendizagem, que refletem as dimensões das experiências individuais, dos comportamentos, das relações e dos sistemas. Por fim a plataforma oferece suporte e ferramentas potentes para superar os desafios do dia a dia. Para começar, basta fazer um cadastro. A plataforma é inteiramente gratuita.